
Um estudo publicado nesta quarta-feira (21/5) pela revista Nature descreve a descoberta de um planeta em movimento retrógrado, nunca visto até então em um sistema com duas estrelas. Até a observação do sistema nomeado de Nu Octantis, acreditava-se que esse tipo de configuração atrapalharia a formação e a estabilidade de planetas.
Os pesquisadores acreditavam que a presença de uma segunda estrela em um mesmo sistema poderia atrapalhar o curso de planetas circunstelares — chamados no estudo de “tipo S”, são aqueles que giram apenas em torno de uma das estrelas. Isso porque esse segundo astro poderia, entre outros fatores, tornar as órbitas dos planetas menos estáveis.
Isso pode ser observado no fato de haver poucos planetas circunstelares em sistemas binários em que as estrelas estão muito próximas uma da outra. No Nu Octantis, porém, apesar de a distância média entre os componentes estelares ser de 2,6 unidades astronômicas (UA) — relativamente próximos —, os cientistas suspeitavam há muito tempo da existência de um planeta primário.
Essa suspeita foi confirmada pela detecção de um corpo celeste que não apenas orbita uma das estrelas, mas faz isso no meio delas, de forma ampla e retrógrada — ou seja, na direção oposta à rotação do astro. Esta é a primeira vez que algo assim é observado de forma prática no espaço, contra motivos teóricos que haviam descartado a possibilidade de formação e estabilidade de planetas tipo S entre estrelas com uma distância tão curta.
Ao portal de divulgação científica IFLScience, um dos responsáveis pelo estudo explicou a dinâmica: “Este planeta é retrógrado no sentido de que ele gira em torno da estrela primária (nu Oct A) na direção oposta à que as duas estrelas giram uma em torno da outra”.
Segundo ele, “a existência deste planeta tem sido controversa, porque não há precedentes observacionais e é esperado que os planetas se formem em órbita prógrada se eles se formarem ao mesmo tempo que as estrelas”.
Ao estudar a formação das órbitas, os pesquisadores identificaram que, no começo, o espaço entre as estrelas do nu Octantis era de 1,3 UA. Devido ao fato de a órbita realizada pelo planeta ser maior do que a distância entre as estrelas durante a formação dos componentes estelares, foi possível entender que seria muito difícil que o corpo tenha sido formado ao mesmo tempo que eles.
Assim, os estudiosos levantam duas hipóteses para o nascimento do planeta: a de que ele pode ter sido originado a partir de uma órbita que envolveria ambas as estrelas, chamada “circumbinária”; ou a partir de um “disco de material” — estrutura de gás e poeira ao redor de uma estrela que possibilita a formação de planetas — que se formou depois dos dois astros.
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A existência do planeta e o movimento inédito dele foram confirmados por medições de velocidade radial. A partir dos experimentos, foi possível identificar que a órbita do corpo celeste ocorre quase no mesmo plano das estrelas — uma delas uma anã branca, ou seja, o que sobrou do núcleo de uma estrela que esgotou o próprio combustível.
Os dados coletados mostram que o nu Octantis teria se formado há 2,9 bilhões de anos — em comparação aos cerca de 4,6 bilhões do Sistema Solar. A estrela que deu origem à anã branca, segundo o estudo, era muito maior que o Sol, por isso teria evoluído de forma muito mais rápida e permitido, após a própria “morte”, a formação do planeta que gira em torno dela.
O fato de planetas poderem ser formados bilhões de anos depois das estrelas às quais circundam, a partir de camadas de um astro morto — inferido a partir de descobertas como esta —, faz com que cientistas reavaliem os limites do que é possível no universo.
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